Iguais, porém diferentes. O que isso significa?

O princípio da igualdade, ou da universalidade, preconiza que todos os seres humanos são iguais em seus direitos e deveres perante a lei e a sociedade. Entretanto, sabemos que somos diferentes em nosso interior, que possuímos inúmeras características que definem nossa identidade e individualidade. Vivemos, então, em um mundo no qual impera a diferença, a diversidade.

A diversidade humana significa que os seres humanos são diferentes em suas formas biológicas, sexuais, etárias, religiosas, nacionais, de gênero, de condições sociais, de pensar e agir, entre tantas outras. Possui aspectos e comportamentos singulares e individuais, ao passo que forma grupos sociais diversos. Traduz-se na singularidade e na identidade de cada indivíduo, bem como na diversidade social e cultural que compõe os grupos e coletivos sociais com características semelhantes entre si. Podemos destacar grupos compostos por pessoas de cores, etnias, idades, gêneros, identidades e orientações sexuais diversas, advindos de regiões e países com culturas diferentes, praticantes de inúmeras religiões e dentre tantas outras diferenças que caracterizam um grupo específico.

Para sintetizar, então, Ferreira diz que 

[...] o conceito de diversidade diz respeito à igualdade inerente à nossa humanidade e à diferença que nos caracteriza como seres históricos, sociais e determinados pela cultura dentro da qual somos inseridos ao nascer e vivemos

(2015, p. 307).

Em um país tão diverso como o Brasil, as marcas da diferença e da desigualdade estão por toda parte. Os espaços sociais de natureza burguesa mantêm, então, a hegemonia de homens adultos, brancos, cristãos e heterossexuais, que são altamente influenciados por uma cultura americanista e/ou eurocêntrica. Os demais grupos, como as mulheres, jovens, idosos, negros, indígenas, LGBTQIA+ etc., ficam em situação de subalternidade. Destarte, o conceito de diferença e, por consequência, os de igualdade e desigualdade, são fundamentais para a compreensão da diversidade.

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Título: A diversidade brasileira
Fonte: 
Prosa (2024b).

Os sujeitos mais prejudicados em virtude da presente ordem social, que formam os grupos inseridos diretamente no debate acerca da diversidade, veem suas diferenças intensificadas na sociedade, que enfatiza a diferenciação econômica a esses sujeitos. Esse movimento materializa as desigualdades gritantes e cada vez mais acentuadas. Nesse sentido, José Fernando Martins (2011) pontua que é necessário tomar o fenômeno da diversidade inserido em seu contexto social, políticoeconômico.

Podemos afirmar que o termo 'diversidade' refere-se às pessoas ou aos grupos sociais que são considerados diferentes do que a classe dominante denomina como padrão ou referência naturalizada nas relações sociais. Na maioria das vezes precarizados, por se distinguirem do dito padrão social ocidental, esses grupos marginalizados – os negros, pardos e indígenas; as mulheres, os jovens e os idosos; a comunidade LGBT; os migrantes, imigrantes e refugiados; os praticantes de religiões de matriz africana e de religiões islâmicas; os de classes sociais economicamente desfavorecidas; os jovens e adultos privados de liberdade, dentre tantos outros –, por não se encaixarem na referência padrão, ganham uma marca identitária que carregam durante toda vida. Assim, a menos que as condições socioeconômicas e culturais mudem, essa marca é perpetuada como um rótulo depreciativo, de acordo com Tomaz Silva (2000).

Nesse contexto, Martins (2011, p. 251) alerta que “sob a sociedade capitalista, as diferenças não são apenas culturais, morais, sexuais, étnicas; são físicas e provocam consequências materiais”. Assim, a luta social e política está na base do conceito de diversidade, segundo Stuart Hall (1997). A divisão entre grupos sociais privilegiados e aqueles sem privilégios encontra-se cada vez mais frágil. As pessoas que se identificam em suas diferenças com seus pares e reconhecem experiências semelhantes organizam-se enquanto grupo social e lutam pelo reconhecimento de seus direitos. O popular passa a ser referência cultural.

Muito mais do que um aspecto negativo, a diversidade é enriquecedora na medida em que possibilita o pensar diferente, a complementaridade e a produção de novos saberes e fazeres. Então, torna-se imprescindível ressaltar que ser diferente, ou pertencer a um grupo diferente, não deve pressupor ser desigual. Na realidade, conforme atesta Boaventura Santos (2006), há que se atentar para ser igual quando a diferença discrimina, e diferente quando a igualdade massifica. 

A frase emblemática de Karl Marx, “de cada um segundo a sua capacidade, a cada um segundo a sua necessidade”, trazida por Iasi (2011, p. 76), expressa o princípio de uma sociedade na qual os recursos seriam distribuídos conforme as necessidades individuais, e cada pessoa contribuiria com o que pudesse de acordo com suas habilidades. Essa visão reflete uma crítica ao capitalismo, que distribui as riquezas de forma desigual, criando assim desigualdades econômicas. 

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Título: O Brasil e a divisão internacional do trabalho
Fonte: 
Prosa (2024c).

Para além das diferenças de classe a que Marx se refere, Boaventura Santos (2006), ao abordar os princípios da alteridade e da equidade em meio à diversidade, reconhece-se que todas as desigualdades sociais devem ser combatidas. Entretanto, ao mesmo tempo, defende-se que as diferenças culturais, de identidade e de grupos sociais não podem ser apagadas em nome de uma igualdade forçada. Enquanto Marx propõe uma redistribuição econômica universalista focada em uma igualdade material, Santos (2006) também nos alerta para a justiça social de maneira mais pluralista, considerando não apenas as questões econômicas, mas também as dimensões culturais e identitárias. Assim, o ato de tocar em termos dos paradoxos da “unidade na diversidade” e da “diferença na igualdade” deve acompanhar, ainda, as práticas educativas ao pensar-se em uma educação emancipatória.

Ao tratar a “unidade na diversidade” e a “diferença na igualdade”, pressupõe-se práticas educativas pautadas no multi e no interculturalismo.

O multiculturalismo reconhece e celebra a diversidade cultural dentro de uma sociedade, enfatizando que diferentes grupos podem coexistir mantendo suas identidades próprias. A "unidade na diversidade" é pautada na ideia de que, apesar das diferenças, todos pertencem a um mesmo espaço social. Por exemplo, em uma escola, a inclusão de diferentes festivais culturais e religiosos promove a unidade, mostrando que todas as culturas têm as suas características e o seu valor.

No interculturalismo, vai além da mera coexistência, incentivando o diálogo e a interação entre culturas. Aqui, a "unidade na diversidade" é entendida como um processo dinâmico em que a convivência ativa entre grupos leva a uma nova compreensão – e potencialmente a uma nova identidade coletiva. A interação e o aprendizado mútuo são essenciais para a construção de uma comunidade mais coesa e uma educação mais inclusiva.

Agora que compreendemos que a humanidade é diversa em seus mais variados aspectos, vamos refletir um pouco sobre como é possível a convivência pacífica e harmoniosa entre pessoas diferentes.