Capítulo 2
Produção histórica das políticas e das bases legais da EPT

O segundo capítulo desta unidade temática, tem como objetivo apresentar os mais significativos instrumentos legais, a legislação e as políticas educacionais de EPT e dela decorrentes nos respectivos contextos, correlacionando-os com os conceitos estudados no capítulo anterior. Tendo a Constituição Federal de 1988 (CF/88) como marco inicial, a educação e o trabalho como direitos sociais e o contexto do federalismo, será apresentada e analisada a evolução da legislação, das estruturas institucionais e os programas mais significativos. Entretanto, o detalhamento da legislação e as políticas de EPT vigentes se dará nos capítulos 4 e 5.
Ao iniciar o estudo de leis, assunto que muitos consideram “chato” e “sem graça”, precisamos imaginar que elas, em cada artigo, inciso ou alínea, são resultantes de muita luta, debates e processos de negociação entre os polos hegemônico e contra-hegemônico da sociedade. Por isso as leis não são imutáveis, elas têm, pelo contrário, um “prazo de validade” social, uma vez que as lutas continuam mesmo após a sua promulgação, sendo descartadas ou emendadas quando as forças sociais agem, ora aumentando, ora restringindo direitos.
Para a garantia dos direitos, por meio da execução das políticas públicas previstas na Constituição, é preciso que elas tenham base legal específica. Mas as normativas não têm peso igual, há uma hierarquia que é estabelecida pelo grau de importância, abrangência ou prioridade. Cada uma também desempenha um papel, que deve ser complementar, com mais detalhes à medida que são elaboradas leis, decretos, portarias, pareceres, resoluções e instruções normativas.
Conhecer e estudar a Constituição federal e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional - LDBEN (Lei n.º 9.394/1996), em particular as polêmicas e contradições que cercam suas implementações, é fundamental tanto para aproveitar o que elas têm de avanço como para formular possíveis mudanças futuras. Além disso, como a EPT está, em grande parte, normatizada na LDBEN, as políticas públicas decorrentes estão submetidas às suas diretrizes, como se verá no capítulo 4 e 5.
Aliás, para facilitar seu processo de aprendizagem, ao final da última página deste capítulo você pode acessar um glossário com definições de termos legais.
Direitos na Constituição Federal de 1988
A Constituição federal promulgada em 1988, elaborada pela Assembleia Nacional Constituinte eleita diretamente em 1986, finalizou, do ponto de vista institucional, a ditadura civil-militar implantada a partir do golpe de 1º de abril de 1964. Conhecida como "Constituição Cidadã", ela ampliou significativamente as garantias individuais e os direitos civis e sociais no Brasil e é considerada, portanto, a 1ª Constituição brasileira na qual o estado de direito e os direitos civis e sociais precedem o poder do Estado.
Embora diversos destes direitos ainda não estejam assegurados para setores significativos da população, é um marco progressista diante de séculos de regimes (e suas respectivas constituições) escravocratas, aristocratas, autoritários e ditatoriais que a antecederam. Fruto de uma intensa participação social e popular de luta contra a ditadura, reflete compromissos com os direitos humanos e a dignidade da pessoa humana e está constantemente sob ataque dos setores conservadores, que atribuem ao “excesso de direitos” a razão dos problemas nacionais.
Título: Diretas Já
Fonte: Agência Brasil (2004).
A contradição entre um “Estado democrático e promotor do bem-estar social” e um “Estado gerenciador dos interesses econômicos e políticos das elites” tem perpassado o atual período democrático, o mais longo da história do Brasil. Mas a Constituição tem resistido, e com ela a perspectiva dos direitos, o que contribui para impulsionar as lutas para efetivá-las. Ainda que no marco do capitalismo, tal contradição, com os limites e restrições que podem caracterizar a democracia brasileira como “incompleta e inacabada”, tem aberto brechas para experiências de políticas públicas emancipatórias.
Historicamente, os direitos têm sido reconhecidos e incorporados às leis de forma gradativa, a partir das reivindicações e lutas sociais. Direitos fundamentais são aqueles essenciais ao ser humano, dispostos na Constituição federal de modo a refletir as demandas políticas da sociedade e limitar o poder do Estado, tais como: direito à vida, à liberdade, direito à igualdade, à segurança, direito à propriedade etc. Por outro lado, garantias individuais são instrumentos que asseguram o exercício efetivo dos direitos fundamentais, possibilitando a prevenção e punição de abusos do Estado e complementando os direitos fundamentais, portanto devem sempre ser analisadas em conjunto. Direitos civis são os direitos de liberdade individual (as chamadas liberdades públicas clássicas) inspirados na Revolução Francesa de 1789 e no liberalismo econômico. Por sua vez, os direitos sociais são caracterizados pelos direitos de igualdade material e são dever do Estado, resultados das reivindicações e de lutas dos movimentos sociais para combater as desigualdades, que incluem, entre outros, direitos trabalhistas, à saúde, à seguridade social e à moradia.
Mas a história não para aí, outros direitos têm sido acrescentados. O quadro a seguir demonstra as “gerações” de direitos conquistados – e a conquistar – no âmbito nacional e internacional.
Título: Quadro dos direitos fundamentais segundo a geração
Elaboração: Prosa (2024a).
Embora a EPT seja fundamental para a garantia dos direitos da 3ª a 5ª geração, ela nasce, enquanto direito e política pública, em consequência dos direitos sociais do trabalho e da educação. A defesa de um direito isoladamente não garante a sua permanência. Compreender esta interdependência dos direitos é essencial para a garantia e aperfeiçoamento de cada um deles.